Prof. Dr. José Luciano de Queiroz Aires (UFCG)
Ontem,
dia 27 de fevereiro de 2016, fui à UFPB prestar solidariedade aos estudantes
que fazem greve de fome protestando contra as condições de permanência e
assistência estudantil.
Duas
cenas me chamaram a atenção. Primeiro, foi ver quatro estudantes pobres,
negros, três deles de outros estados, acorrentados, fazendo uma greve de fome
que já durava mais de 100 horas. Na saída, vi outra cena completamente
distinta. Um campo de futebol no interior da UFPB no qual vários estudantes
batiam uma bola e, certamente, depois tomariam um banho, iam para as suas casas
e, talvez, à noite dar uma volta na orla de Tambaú, beber um Whisky e petiscar
um prato caríssimo. Já os acorrentados grevistas, necessitam de um Restaurante
Universitário de qualidade e de uma boa Residência Universitária, pois não
basta o acesso à universidade pública, mas políticas de permanência e
assistência aos estudantes. O mais revoltante é ouvir de certas bocas de
frações de classe média reacionária que as quotas raciais e sociais é “um
privilégio”. Dizem isso porque, como assinala Marilena Chauí, a classe média
sonha em ser burguesia e nutre um preconceito para com negros, pobres,
camponeses, indígenas, quilombolas.
Essa
primeira imagem, que me veio à retina, é o retrato da tragédia das
universidades públicas brasileiras. Por mais que tenha havido uma expansão e
uma inclusão, a mesma se deu de forma precarizada e os sinais evidentes podem
ser notados nos cortes orçamentários, nas obras inacabadas e na triste
realidade na qual se encontram, sobretudo, estudantes pobres, filhos de classe
trabalhadora, ameaçados de saírem pelas mesmas portas que entraram. Já a
segunda imagem fez meus olhos ficarem verdes e brancos, era a cor do gramado do
campo de futebol e da elite branca para a qual se construiu as primeiras
universidades brasileiras no inicio do século XIX, contratando com a cena dos
lutadores guerreiros que acampam na frente da reitoria.
Esse
fato da UFPB é um micro exemplo de um processo macroscópico que acontece dentro
das universidades públicas. Alguns estudantes e docentes resistem mais do que
outros, mas o desmonte do serviço público, o avanço da terceirização, os cortes
no PIBID e em outros programas destinados a estudantes são visíveis a todos que
queiram olhar a realidade com um pouco de racionalidade e sem paixonite aguda.
Por outro lado, os ônibus de estudantes que vêm do interior, ao pararem em
frente às universidade públicas deixam nelas, quatro ou cinco estudantes, pois
a maioria tem como destino as grandes empresas de faculdades privadas com
dinheiro repassado pelo governo federal por meio do FIES. Desse modo, podemos
dizer que o governo federal cumpre os compromissos com os organismos
internacionais e com os empresários da educação, ao passo que os reitores se transformam
em meros coadjuvantes desse processo de precarização de nossas universidades. A
própria ANDIFES, associação dos reitores, salvas as raríssimas exceções no seu
interior, não enfrenta o governo, não faz resistência ao MEC e MPOG no sentido
de reverter os cortes e ampliar as verbas para a educação pública, gratuita e
de qualidade. Escondem o jogo, tapam buracos e procuram cumprir o que manda o
governo: “façam muito com pouco, sejam criativos”. Portanto, o buraco é bem em
cima, mas também aqui embaixo.
Desse
modo, temos uma universidade pública dualista: estudantes de classe média têm
uma certa facilidade para estudar, comprar livros, fazer curso de línguas,
pegar um carro para ir para casa e ainda sobra tempo para bater uma pelada. A
outra universidade é pobre, é negra, é indígena, é sem terra. Esta precisa de
auxílio moradia para todos, de um restaurante universitário de qualidade, de
creche para deixar seus filhos enquanto estudam, de grana para comprar o passe
para pegar o transporte público ou pagar aluguel, caso seja necessário morar fora
da universidade.
A
primeira universidade fala de meritocracia, a segunda fala de cidadania. A
segunda é que sempre foi excluída do acesso ao ensino superior, enquanto a
primeira sempre foi privilegiada, depois de pagar um caro cursinho. Por isso,
que se dane a tal da meritocracia e que as universidades públicas se encham
cada vez mais de povo. Mas, para isso, não basta a entrada, e sim, as condições
de permanência.
Meu
total e irrestrito aos estudantes da UFPB!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!